quinta-feira, 25 de setembro de 2008

...preciosidades...

Bem... Quer dizer, depois das viagens no espaço para milionários, já tudo se espera... Mas, assim como assim, uma viagem no espaço, há-de proporcionar uma vivência (ainda que efémera) fabulosa... Pese embora, todos os recursos irremediavelmente perdidos, para o regozijo, até certo ponto inútil, de meia dúzia de pessoas...
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Agora digam-me, qual é o interesse de ter um computador portátil banhado a ouro!? O problema deve ser meu, até tenho dificuldade em perceber, coisas aparentemente simples como as jóias... O que é facto é que li hoje "Bentley lança portátil coberto a ouro"... O que a meu ver, é uma grande parolice!
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Mas há mais, hoje também li "a primeira edição do livro contemporâneo mais caro do mundo, "Michelangelo - La Dotta Mano" ("Miguel Ângelo - A Mão Sábia", em tradução literal), que custa 100 mil euros, esgotou-se cerca de um mês após o lançamento..." (FONTE: Público) Esgotou-se... Pois, pudera... Então, só lançaram 33 exemplares!!! Dizem que "os livros da colecção Book Wonderful representam uma maneira de reagir à ameaça de desaparecimento do livro impresso, causada pela Internet"... Podem não desaparecer, mas ficam assim muito poucochinhos, raros, quase a ponto da extinção, só para quem pode...
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A descrição da obra (de série limitada só para endinheirados), é deliciosamente requintada, ora leiam:

"A capa contém uma réplica em mármore da escultura “Madonna della Scala”, (...) realizada com mármore do proveniente da mesma pedreira, Il Polvaccio (...) O veludo de seda que cobre a capa foi confeccionado em teares antigos, capazes de produzir apenas oito centímetros de tecido por dia. O luxuoso papel, em puro algodão, é produzido à mão, fibra por fibra. A encadernação também é toda feita à mão e costurada página a página."

Que preciosidade... Até me fez lembrar um poema do António Gedeão, intitula-se "Poema do fecho-éclair" e diz assim:

Filipe II
tinha um colar de oiro,
tinha um colar de oiro
com pedras rubis.
Cingia a cintura
com cinto de oiro,
com fivela de oiro,
olho de perdiz.
-
Comia num prato
de prata lavrada
girafa trufada,
rissóis de serpente.
O copo era um gomo
que em flor desabrocha,
de cristal de rocha
do mais transparente.
-
Andava nas salas
forradas de Arrás,
com panos por cima,
pela frente e por trás.
Tapetes flamengos,
combates de galos,
alões e podengos,
falcões e cavalos.
-
Dormia na cama
de prata maciça
com dossel de lhama
de franja roliça.
Na mesa do canto
vermelho damasco,
e a tíbia de um santo
guardada num frasco.
-
Foi dono da Terra,
foi senhor do Mundo,
nada lhe faltava,
Filipe Segundo.
Tinha oiro e prata,
pedras nunca vistas,

safiras, topázios,
rubis, ametistas.
-
Tinha tudo, tudo,
sem peso nem conta,
bragas de veludo,
peliças de lontra.
Um homem tão grande
tem tudo o que quer.
O que ele não tinha
era um fecho-éclair.

-
António Gedeão

É que hoje percebi porque é que este poema sempre me encantou... De facto, à luz dos nossos dias há "luxos" e "preciosidades" que passaram a ser caricatos, mesmo engraçados! Ainda assim, permanecem, mas parece-me natural, a emancipação da humanidade tem demorado milhares de anos e ainda tem um longo caminho a percorrer...
MDC

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