domingo, 22 de março de 2009

Dia Nacional do Teatro de Amadores

21 de Março

“Amigo, maior que o pensamento. Por essa estrada amigo vem. Não percas tempo que o vento é meu amigo também. Em terra, em todas as fronteiras. Seja bem-vindo quer vier por bem. Se alguém houver que não queira trá-lo contigo também”.

Se pudesse comprar palavras, estas, seria por certo dono delas. Mas, o seu a seu dono, são palavras de José (Zeca) Afonso, da cantiga – “Traz um amigo também”.

É no ano que completo quarenta anos de vida no teatro, que a minha memória me leva ao ano de 1969, no Grupo dos Modestos (extinto em 1988), na peça “TODO O MUNDO E NINGUÉM”, de Gil Vicente, no papel de Dinato, com encenação de Leandro Vale. A ANTA trouxe-me até aqui, depois de tanto intervir no seu sítio, umas vezes, com palavras certas, outras vezes, com palavras a passear…
Mas, como não somos donos das palavras, nem tão pouco as podemos comprar, somos às vezes, (muitas vezes), escravos da palavra. É por isso que o meu “dom da palavra” me impulsiona a escrever:

- O teatro de amadores das associações tem de facto um “papel principal” no desenvolvimento cultural dos locais e regiões onde está inserido.

E tal como o ensino básico, é uma “escola” necessária no desenvolvimento social da população, por isso, os amadores de teatro das associações, devem ser responsáveis e terem orgulho de pertencerem à grande região que produz teatro no nosso País.
E, se atendermos à importância que o Movimento Associativo tem na Sociedade através das suas mais diversas actividades, mais orgulhosos podemos estar.

Daí que devemos, TODOS E CADA UM, com a dignidade que o teatro nos merece, sermos (nos ensaios, nos espectáculos, todos os dias) responsáveis, pelo que significa o teatro de amadores das associações, ou como digo: (expressão que criei) o teatro associativo.

E quando se falar na “reforma artística”, devemos antes saber (e por isso é prioritário) o que significa a RESPONSABILIDADE DE SER AMADOR DE TEATRO.

A criatividade, o espírito de sacrifício e a solidariedade, quando aliados a uma saudável aprendizagem associativa, são verdadeiramente bases sócio-culturais importantes, que o teatro coloca à disposição da sociedade substituindo, em grande medida, o “papel principal” dos governantes.
Então, chegados a este conhecimento, sabemos que, com a nossa “mão-de-obra barata”, colocamos à disposição da grande maioria da população, o nosso trabalho técnico/artístico, conscientes de que prestamos um serviço sócio-cultural à sociedade.

E, não é pelo facto de sermos compulsivamente apaixonados “AMANTES DE TALMA “, que a nossa paixão é cega.
Sabemos, que hoje, e cada vez mais, é necessário saber “suar a camisola”.
Todos sabemos o que temos feito, mas, o que muitos não sabem, é o significado da RESPONSABILIDADE DE SER AMADOR DE TEATRO.

Sabemos que a tarefa não é fácil pois, infelizmente, ainda há muito “boa gente” que julga que
o teatro de amadores das associações, é uma actividade de recreio, ou de lazer.
Pior é quando pensam que pelo facto de ser AMADOR... serve de desculpa!
E mais, não se importam nada de ouvirem dizer “Para amadores não está mal” , e até consideram um elogio.
É urgente dizer, a quem assim pensa, o que significa a RESPONSABILIDADE DE SER AMADOR DE TEATRO.

Companheiros:
Não é minha intenção” meter o nariz no pó do palco dos outros”, mas é meu entendimento, o quanto é prioritário alterar esta forma de estar e pensar o teatro produzido nas associações.

Todos nós já recebemos muitas manifestações de apreço de organismos, de instituições e personalidades, que nos dizem que estamos no caminho certo, e que o serviço que prestamos e colocamos à disposição da população é uma mais-valia sócio-cultural, associativa e artística. Mas, apesar de todos estes incentivos, temos que (peça a peça), ano após ano, melhorar o nosso trabalho, para que não considerem os nossos pedidos de apoio, uma exigência fútil, mas sim, uma pretensão que nos assiste quando queremos melhorar as condições do nosso trabalho e servir com melhor qualidade as populações.
Também sabemos, e temos disso consciência, que a pretensão que temos para com o “nosso teatro” só é possível com o apoio indispensável de parceiros interessados no crescer cultural da nossa terra.
E quando digo “crescer” refiro-me particularmente ao crescimento cultural das crianças, dos jovens e, por que não, dos adultos.
Todas as artes são importantes e, neste caso particular, o teatro, para a formação dos cidadãos, e quanto mais pequenos melhor.
Podemos não saber o que é que queremos que eles aprendam mas, que devem aprender uma arte, isso devem.
Com esta aprendizagem, vão ter por certo uma melhor visão da vida e do mundo e, como sabemos, as crianças expressam-se naturalmente. Faz parte da sua descoberta do mundo que as rodeia.
Experimentam coisas através de um jogo permanente com a realidade.
Tal como as crianças, os jovens e os adultos, têm no teatro esse prazenteiro jogo do «fazer-de-conta», que possibilita conhecer melhor as humanidades.

Claro que não será por isso que todos serão técnicos ou intérpretes mas serão, por certo, cidadãos com princípios éticos, capazes de saber partilhar e ter conceitos mais ricos e diversificados.
E se pensarmos que primeiro aprendemos a falar e, depois, mais tarde, na escola, aprendemos o abecedário, podemos ter em conta que no teatro se pode e deve aplicar esta verdade como princípio.
Primeiro aprender a cultura e a ética teatral, ter urbanidade para e com a arte e, depois, mais tarde, na “escola”, aprender a formação técnica e artística.

Se quiserem ter a compreensão de que esta base ética é fundamental, o teatro de amadores das associações é, (deve e pode ser), uma boa escola da vida.

Estar ou ser do teatro, é um confronto permanente com a realidade.
Os primeiros contactos devem ser de forma lúdica e divertida o que os torna, mais tarde, activos e com sentido crítico e participativo.
Aprende-se com todos os sentidos e fica-se mais aberto àquilo que desconhecemos.

É bom que se entenda que o teatro, tal como as outras artes, é um espaço de liberdade e criatividade, onde existe a possibilidade de criar uma mudança de atitude.
Como diz Kant: - «apenas os gostos se discutem»

Mas, no teatro, discutir é procurar estabelecer pontes, é falar das emoções e vivências partilhadas tendo por base experiências de vida muito diferentes.
O papel do teatro é esse mesmo: - Proporcionar um sonho de comunidade entre indivíduos distintos.

Estar no teatro é muito mais do que se imagina, ou do que aquilo que se pode encontrar nos livros.
Ser do teatro é saber que há objectos inúteis mas que contêm em si os mais elevados valores.
O teatro é um curso, que nem uma vida inteira chega para o concluir. Por isso se diz:

- “O que custa mais, são os primeiros 30 anos”
No teatro, nada é mais importante do que proporcionar a possibilidade de ser cada vez melhor, com a certeza saudável de que nunca se atingirá a perfeição.

E assim, será muito mais possível acreditar num futuro melhor.
Num futuro onde hajam Mulheres e Homens com motivação para investirem, não só no seu crescimento social e na sua qualidade de vida cultural mas, também, para contribuírem para o desenvolvimento do local onde estão inseridos.
Mas para isso não chegam só as boas vontades, o voluntariado, ou até, ter gente com mais ou menos capacidades técnicas e artísticas, pois sabemos que, cada vez mais, a tecnologia é indispensável nos meios de produção.
Hoje, mais do que nunca, a utilização de meios técnicos faz parte da formação e do trabalho de cada um. Hoje, a qualidade de vida, tem que passar pela utilização das novas tecnologias.

Cabe, por isso, aos dirigentes artísticos e associativos, aos agentes culturais, aos patrocinadores, às Juntas de Freguesia, às autarquias, (já que o governo central não aceita pedidos de apoio dos amadores de teatro) um maior esforço nos apoios, e na contribuição para o crescimento sócio-cultural das artes dos palcos associativos.

Enquanto isso não for possível, com mais ou menos dificuldades, continuaremos, com “a “mão-de-obra barata” que somos A LEVAR O TEATRO À PORTA DOS FREGUESES.

Valha-nos a muita paixão que sentimos pelo teatro, valha-nos a muita perseverança que temos em querer melhorar a vida cultural do País que somos, que aliadas a alguns apoios públicos, e à solidariedade de personalidades e organismos, que acreditam no trabalho dos amadores de teatro, vai sendo possível, levar por diante esta maravilhosa tarefa artística e sócio-cultural , chamada TEATRO. Valha-nos isso.

Mas não nos devemos esquecer o quanto é importante saber o que é A RESPONSABILIDADE DE SER AMADOR DE TEATRO.

O teatro de amadores das associações é, de facto, e sem demagogias, uma grande escola de humanização para a vida social, cultural e associativa.

Alfredo Correia . 21 de Março de 2009
MDC

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